Enquanto a diplomacia tenta aplacar a tensão proveniente da delicada questão da Ucrânia, a Rússia e o Ocidente seguem medindo forças e ampliando a atividade militar na Europa Oriental. De um lado, Moscou deslocou um contingente recorde de tropas e equipamentos para Belarus, dando início a exercícios militares conjuntos. Do outro, os EUA anunciaram o envio de milhares de soldados para fortalecer as fronteiras europeias da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte). As informações são da rede
Radio Free Europe.
Em coletiva de imprensa nesta quinta-feira (3), em Bruxelas, o secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg, acusou Moscou de reunir cerca de 30 mil combatentes e armas modernas em Belarus nos últimos dias. O número representa o maior destacamento militar russo no país vizinho desde o fim da Guerra Fria.
A fala do chefe da aliança atlântica veio após o anúncio de Washington sobre o envio de milhares de soldados à Europa para reforçar os Estados-Membros. A movimentação é motivada por um volumoso acúmulo de tropas russas ao longo da fronteira ucraniana, cenário que o Ocidente interpreta como o capítulo introdutório de uma invasão.
Aproximadamente mil soldados norte-americanos na Alemanha foram enviados à Romênia, enquanto outros 2 mil estacionados nos Estados Unidos viajarão para Alemanha e Polônia, disse o Pentágono.
Ainda nesta quinta, o Kremlin repetiu o argumento de que não intenciona uma incursão à ex-república soviética e que tais ações do Ocidente são contraproducentes, sendo que a medida dos EUA, em vez de estancar a crise, só a aumentaria. “Estamos constantemente pedindo a nossos parceiros americanos que parem de aumentar as tensões no continente europeu”, disse o porta-voz Dmitry Peskov.
Início dos exercícios
Moscou e Minsk anunciaram em janeiro exercícios militares conjuntos perto das fronteiras com a Ucrânia e com Estados-Membros da Otan. As manobras, batizadas Allied Resolve (Determinação Aliada, em tradução livre), começam nesta quinta (3).
Especialistas calculam que a Rússia tenha mais de 100 mil soldados nas proximidades da Ucrânia, sendo necessária uma força de 175 mil para invadir, além de mais combustível e munição. Conforme o cenário descrito pela inteligência dos EUA, as tropas russas invadiriam o país vizinho pela Crimeia e por Belarus.
O Kremlin não divulgou a quantidade de tropas que enviou para Belarus, mas o ministro da Defesa, Sergei Shoigu, que chegou a Belarus nesta quinta para o início das atividades conjuntas, revelou que o contingente está abaixo do máximo de 13 mil soldados, número acordado em 2011 sob as regras OSCE (Organização para Segurança e Cooperação na Europa), conforme estabelecido no Documento de Viena.
Ministro da Defesa russo, Sergei Shoigu, e o líder belarusso Alexander Lukashenko (Foto: Russia-1/captura de tela)
Stoltenberg relatou que a Rússia levou para Belarus forças de operações especiais Speznaz, caças SU-35, mísseis Iskander de capacidade dupla e sistemas de defesa aérea S-400.
“Tudo isso será combinado com o exercício anual das forças nucleares da Rússia”, acrescentou Stoltenberg. O termo “dual-capable” (capacidade dupla) usado pelo secretário-geral para falar dos mísseis Iskander diz respeito a armas destinadas à guerra convencional e nuclear.
O chefe da Otan também instou Moscou a tomar medidas que visem a amenizar a situação, além de repetir advertências de que “qualquer agressão russa teria consequências graves e custaria um preço alto”.
Otan saúda tropas americanas
Stoltenberg saudou nesta quinta-feira o anúncio de Washington para o envio de mais tropas à Europa, noticiou a rede Voice of America (VOA). Ele também disse que a Otan tem planos de enviar forças adicionais para a parte sudeste de sua aliança em meio à turbulência na fronteira entre Rússia e Ucrânia.
A autoridade declarou na coletiva que a aliança está preparada para a hipótese de uma ação militar russa, ao mesmo tempo em que continua a postos para se engajar em um “diálogo significativo” e encontrar uma solução diplomática.
Por que isso importa?
A tensão entre Ucrânia e Rússia explodiu com a anexação da Crimeia por Moscou. Tudo começou no final de 2013, quando o então presidente da Ucrânia, o pró-Kremlin Viktor Yanukovych, se recusou a assinar um acordo que estreitaria as relações do país com a UE. A decisão levou a protestos em massa que culminaram com a fuga de Yanukovych para Moscou em fevereiro de 2014.
Após a fuga do presidente, grupos pró-Moscou aproveitaram o vazio no governo nacional para assumir o comando da península da Crimeia e declarar sua independência. Então, em março de 2014, as autoridades locais realizaram um referendo sobre a “reunificação” da região com a Rússia. A aprovação foi superior a 90%.
Com base no referendo, considerado ilegal pela ONU (Organização das Nações Unidas), a Crimeia passou a se considerar território russo. Entre outras medidas, adotou o rublo russo como moeda e mudou o código dos telefones para o número usado na Rússia.
Paralelamente à questão da Crimeia, Moscou também apoia os separatistas ucranianos que enfrentam as forças de Kiev na região leste da Ucrânia desde abril de 2014. O conflito armado, que já matou mais de dez mil pessoas, opõe ao governo ucraniano as forças separatistas das autodeclaradas Repúblicas Populares de Donetsk e Lugansk, que formam a região de Donbass e contam com suporte militar russo.
Em 2021, as tensões escalaram na fronteira entre os dois países. Washington tem monitorado o crescimento do exército russo na região fronteiriça e compartilhou informações de inteligência com seus aliados. Os dados apontam um aumento de tropas e artilharia russas que permitiriam um avanço rápido e em grande escala, bastando para isso a aprovação de Putin.
Conforme o cenário descrito pela inteligência dos EUA, as tropas russas invadiriam a Ucrânia pela Crimeia e por Belarus, com potencialmente cem mil soldados. A Ucrânia estima um contingente de 90 mil soldados de Moscou prontos para atacar, enquanto a inteligência norte-americana fala em 50 mil.
Um eventual conflito, porém, não seria tão fácil para Moscou como os anteriores. Isso porque, desde 2014, o Ocidente ajudou a Ucrânia a fortalecer suas forças armadas, com fornecimento de armamento, tecnologia e treinamento. Assim, embora Putin negue qualquer intenção de lançar uma ofensiva, suas tropas enfrentariam um exército ucraniano muito mais capaz de resistir.
FONTE: A REFERÊNCIA | EDIÇÃO: REDAÇÃO GRUPO M4
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